domingo, 8 de maio de 2022

LEGALMENTE LOIRA (2001) - RESENHA CRÍTICA



Não sou o maior fã de comédias românticas. Acho que o gênero teve seu auge nos anos 1990, mas desde os anos 2000 é um tipo de filme cansado e previsível, com tramas manjadas, batidas de roteiro muito fáceis de antecipar e estereótipos já super conhecidos do público que geralmente assiste estes filmes, então não é muito difícil imaginar o motivo de este gênero ter entrado em uma espécie de geladeira em Hollywood, com cada vez menos produções financeiramente bem-sucedidas: o olhar do público já não tem sido mais o mesmo desde então. Naturalmente, há outros fatores que podem explicar muito bem esse declínio: conflito geracional, ascensão de outros gêneros (notoriamente, o mais avassalador foi o de super-heróis) e, como já citado no começo, o esgotamento da fórmula. 

E nesse cenário, não acho que se possa dizer que "Legalmente Loira" tenha quebrado tanto a risca da comédia romântica, e em muitos aspectos ele continua sendo um reflexo de seu tempo. Não sei se seria o tipo de longa que eu tomaria espontaneamente a decisão de ver, mas não posso me dizer arrependido por isso. Embora ele não possa exatamente se encaixar no conceito de crítica social foda, acredito que este projeto é um pouquinho mais esperto do que parece à primeira vista. Lançado em 2001 e dirigido por Robert Luketic (que estava em seu segundo trabalho, mas este acabou sendo seu maior sucesso de bilheteria) e estrela Reese Witherspoon, Luke Wilson, Selma Blair, Matthew Davis e Victor Garber. Tem também algumas participações especiais, como Ali Larter (de "Resident Evil" e "Premonição"), Jennifer Coolidge (a Mãe do Stifler em "American Pie") e Linda Cardeline (a Velma de "Scooby Doo"). 

Por que eu asssiti a esse filme, então, vocês me perguntam? Porque minha namorada pediu, e na nossa relação, sou eu quem dá a última palavra: "sim, senhora".

A trama é a seguinte: Witherspoon é Elle Woods, a típica patricinha bonita, loira e rica de quem não se espera mais do que o batido estereótipo da gostosa burra, e que tem um namorado rico e bonito, de quem ela espera um pedido de casamento. Só que logo descobrimos que ele é um tremendo babaca: ele a larga no dia em que ela esperava o pedido e isso a deixa totalmente frustrada. Porém, motivada a reconquistá-lo (bem na vibe "A Pequena Sereia"), a loira decide entrar na Universidade de Direito de Harvard, onde o rapaz vai estudar, para impressioná-lo. O projeto começa bem nessa vibe de comédia de patricinha fútil, o que é uma preparação que não deixa de ser curiosa, considerando o desenvolvimento da trama, no qual vamos descobrindo que nem tudo é o que parece e que os estereótipos podem ser enganosos.

A direção de Luketic aqui é funcional, ele não é conhecido exatamente pela autoralidade, mas funciona. Ele consegue fazer a trama funcionar e tem alguns enquadramentos até criativos. Tem uma certa cena que eu achei muito interessante, na qual a protagonista entra no ambiente da faculdade e o diretor usa um plano holandês para indicar meio que vertigem e desorientação. Ela é uma estranha no ninho e o filme está bem ciente disso. A todo o tempo somos lembrados de que ela é como um peixe fora d'água e que aquele lugar inicialmente está pronto para regurgitá-la a qualquer momento, e isso é traduzido tanto nos diálogos quanto nos visuais, com ela quase sempre destoando muito do ambiente.

O roteiro, porém, não é muito mais do que previsível. Você sabe tudo o que vai acontecer desde o começo, o filme não faz questão de furar a bolha da comédia romântica e... tá tudo bem. Não é como se o público-alvo comum desse projeto se interessasse por filmes-conceitão, então, aposta-se no seguro: com poucos minutos somos apresentados à protagonista, suas amigas e ao conflito que vai nortear o desenvolvimento da trama, o que não deixa de ser algo bem ágil, então podemos dar pontos ao roteiro por ser honesto o suficiente. O humor, porém, funciona: temos piadas com bom timing cômico.

As atuações são OK, ninguém aqui está atrás de Oscar. A que mais se destaca é evidentemente Reese Witherspoon, com todo o seu charme e carisma. É uma atriz que inclusive ganhou estatueta do carecão pelado alguns anos depois, e aqui ela entrega uma personagem que, se parece boba à primeira vista, acaba apresentando outras dimensões com o passar da trama. Não é particularmente bem escrita, mas funciona bem. O arco dramático dela está todo desenvolvido em torno da famosa quebra do estereótipo da loira burra e isso o filme faz muito bem, Witherspoon consegue convencer como a "loira burra" que de burra não tem nada. E no clímax do terceiro ato, ela consegue se sobressair sendo exatamente a pessoa que era antes de entrar na faculdade, o que funciona também como certo aspecto do humor presente na obra. 

Acho que se tem algo mais a se destacar sobre o projeto, é a forma como ele envelheceu: há pessoas hoje em dia que veem certo panfleto feminista na forma como "Legalmente Loira" conta a história de sua protagonista, pondo como justificativa exatamente a ideia da quebra de estereótipo que discutimos aqui. Você pode, ainda, falar sobre o machismo presente no ambiente de trabalho, que se traduz na forma de assédio sexual contra a protagonista por Callahan (Victor Garber), seu professor, bem como a relação de Elle Woods com Vivian, a personagem de Selma Blair, que começa como uma disputa das duas pelo babaca ex-namorado de Elle (que virou noivo de Vivian) mas gradativamente se transforma numa genuína amizade entre elas duas, o que parece ser um bom comentário sobre como mulheres não deveriam ser inimigas entre si. 

Só que, a meu ver, isso não vai tão além, por decisões do próprio filme, que, lembrando, é uma comédia romântica. A personagem de Witherspoon não é uma mulher pobre ou necessitada que come o pão que o diabo amassou em um ambiente de convivência opressor e completamente resistente a ela. Ela é branca, loira, rica (falem sério, ela dirige um Porsche Boxster boladão, não é como se ela tivesse realmente alguma dificuldade na vida) e decide cursar Harvard por puro capricho (por causa de macho, lembrando). E que, a qualquer momento, poderia simplesmente sair dali e voltar a fazer o que fazia antes. Poderia ter algum tipo de crítica social foda aqui? Talvez, e tem elementos que deixam o filme bem suscetível a essas interpretações, mas é o tipo da coisa que foi feito melhor em outros filmes, alguns até do mesmo gênero. Acho que o meu recado está dado: se há feminismo neste filme, ele é muito superficial e não serve muito mais do que ao desenvolvimento da própria protagonista. 

E assim, "Legalmente Loira" não é muito mais do que um entretenimento OK, com atuações funcionais, humor bem resolvido e que sabe que não reinventa a roda. Ainda assim, encontra força em sua protagonista, cujas atuação e desenvolvimento de arco dramático carregam o filme nas costas.

Nota: 6,5


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