sábado, 21 de setembro de 2019

Sobre "Nós" (2019)

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"Nós" (Jordan Peele, 2019)

Difícil decidir por onde começar a falar deste filme. Na verdade, acho que é difícil até escrever sobre ele. Mas vamos tentar.

É um projeto MUITO diferente, em todos os sentidos, de "Corra", o primeiro desse diretor. Se lá havia um subtexto que muito mais parecia um gancho de direita na nossa cara sobre a questão racial, este aqui é muito mais subjetivo e cheio de alegorias e nuances a serem observadas. 

O filme começa com cenas relativamente longas de apresentação dos personagens e consegue nos fazer simpatizar com eles com louvor, principalmente a da Lupita Nyong'o. A princípio não ficou muito claro para mim o período exato do filme, mas logo depois entendi que a garotinha do começo seria a personagem de Lupita anos depois.

Feitas as apresentações dos personagens, o filme começa a decolar ainda no primeiro ato com cenas aparentemente simples, mas extremamente tensas. E também começa a desenvolver um ar de mistério, que se mantém durante todo o longa. Juntou tensão e mistério de forma convincente em um único filme? Tchau e benção. É só correr pro abraço.

E daí pra frente o filme decola de vez. Não demora muito para os vilões aparecerem, e quando aparecem, a sensação de mistério e incômodo vão aumentando cada vez mais, a ponto de você ficar se perguntando sempre: “mas que merda é essa?” 

Jordan Peele, contudo, não apenas sabe disso, mas também quer te induzir a isso. Cada cena e cada gesto dos atores são muito bem guiados para provocar estas sensações no espectador. Mas... o diretor-roteirista vai além. Ele demonstra tanto domínio do terror como gênero narrativo, bem como de seus subgêneros (sendo invasão domiciliar e slasher os mais gritantes aqui) que subverte tudo em certos momentos do segundo ato e o resultado se traduz em camadas inteiramente novas de mistério. 

Com isso, diferente de “Corra”, além de não ter um alvo objetivo, “Nós” também não traz muitas respostas objetivas, deixando essa tarefa a cargo da mente de cada espectador.

Mas isso não seria possível sem a escolha cerebral do elenco. E aqui temos mais um acerto de Peele: os atores são MUITO BONS! Eles conseguem trazer características únicas e marcantes tanto para seus “originais” quanto para suas versões sombrias e isso fica evidenciado a cada cena em que somos postos diante da confrontação entre as “versões” de cada personagem. E as versões sombrias são simplesmente tenebrosas e assustadoras e põem um contraponto paradoxal e bem-sucedido em representar o mais brutal perigo em relação a suas versões normais, o que evidencia ainda mais o brilhantismo destes atores. 

O filme se dirige para o fim com cada vez mais mistérios e não parece muito disposto a trazer respostas para estes mistérios, o que aumenta ainda mais o incômodo do espectador. 

Eu, por exemplo, olhei a duração do projeto em alguns momentos pra saber quanto tempo faltava e, quando faltavam apenas dez minutos para acabar, fiquei tipo “tá, mas e aí? Não vai explicar mais nada?” ... e aqui mora o último e maior acerto do diretor: deixar perguntas abertas. O maior triunfo de um filme é quando ele causa reflexão e conversas, e Peele consegue isso com louvor. 

Muitas coisas a serem respondidas trazem muitas interpretações diferentes possíveis e a dialética entre elas é o que torna “Nós” tão interessante e cheio de significado. Pois quando um filme consegue trazer tantas coisas já conhecidas e ao mesmo tempo convergi-las a fim de criar algo inteiramente novo e desconhecido – e, por isso mesmo, mais assustador e perturbador – é possível entender que estamos diante de um novo grande mestre do terror, capaz de unir o básico ao complexo com maestria.

Jordan Peele é, sem dúvida, um gênio.

QUE FILMAÇO.

Nota: 9,5

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