sábado, 2 de maio de 2020

"Alien" e o... sexploitation?



É interessante pensar sobre este filme hoje em dia. Afinal, já se vão mais de 40 anos deste que é um dos melhores filmes de ficção-científica da história. "Alien" não apenas trouxe uma corajosa mistura entre terror e ficção científica para o cenário dos blockbusters (ainda mais ao ser lançado apenas um ano após Star Wars), mas também estabeleceu regras para o funcionamento de um bom horror, seja ficção-científica ou não.

Assim como "Tubarão", de Steven Spielberg, lançado quatro anos antes, Alien tem pouco ou quase nada de CGI. Sendo assim, predominam os bem-vindos efeitos práticos. Além disso,temos boa parte do seu subtexto focado em exploração da força de trabalho por um conglomerado de empresas inescrupulosas.

Assim, é um longa-metragem que envelheceu muito pouco, tanto do ponto de vista estético, quanto da temática abordada. É um filme bastante atual. Ah, e neste momento de pandemia, mais ainda, ainda mais tendo em mente a famosíssima frase de Ellen Ripley, a protagonista, sobre a necessária quarentena em relação a um dos membros da tripulação da Nostromo (espaçonave mineradora do grupo), que havia sido atacado por um facehugger (organismo de incubação do alienígena no hospedeiro humano).

"Escute-me, se sairmos da quarentena, vamos todos morrer."

E é de Ellen Ripley que efetivamente falaremos nesse texto.


O desenvolvimento da protagonista ao longo da fita é, como todo o restante do longa, muito calmo e sem grandes solavancos. Ela começa tímida, ainda mais em relação a outros membros, mas vai ganhando seu espaço pouco a pouco, com sua assertividade e perspicácia. Ripley acaba sendo a única sobrevivente, já que o xenomorfo (o alienígena) acabou matando todos os outros. É ela quem primeiro entra em contato com as reais intenções da empresa mineradora para com o espécime alienígena. Ripley é quase morta por Ash, o oficial de ciências da Nostromo, que é revelado ser um androide.

Ao final do filme, Ripley escapa da Nostromo com o gatinho Jones, usando a Narcissus. Já acreditando estar em segurança, a tenente se despe de quase toda sua paramentação até ali e fica seminua, sem saber que ainda teria que enfrentar o xenomorfo uma última vez para finalmente terminar aquela aventura com vida.


É um tanto intrigante olhar para essa cena com os olhos da atualidade. Em meio a tantas discussões sobre o sexploitation nos dias atuais, seria - e é - muito fácil condenar essa cena. Afinal, o corpo de Sigourney Weaver é quase que totalmente exposto nessa cena - e a atriz é considerada sex symbol por alguns por causa disso - o que para mim é algo totalmente descabido em todos os níveis.
Quem alça essa cena a um exemplo de sexploitation tem lá suas razões. Primeiro que não é difícil imaginar que tenha havido certa malícia do diretor e dos produtores ao fazer a cena. Segundo que... Num contexto em que o principal antagonista do filme é o Xenomorfo, uma criatura cuja cabeça possui formato fálico, nos famigerados anos 70, quem não apostaria nessa interpretação? É bem fácil, ainda mais com os olhos da atualidade.

Mas tem uma outra interpretação possível para a cena, e essa para mim é muito mais edificante e em acordo com o contexto do filme, além de ser um desfecho genial para a própria protagonista. Ripley é uma tenente com cara de bad-ass durante o filme todo, que precisa se manter firme para suportar a perda dos companheiros um a um para o alienígena. Precisou ainda ter sangue frio para escapar do algoz, uma das criaturas mais roubadas da ficção-científica, em condições que o favoreciam: os corredores estreitos e àquela altura escuros da Nostromo eram o melhor cenário possível para o organismo adaptativo do Xenomorfo.

Assim, ver toda a fragilidade humana de Ripley no final, com seu corpo esguio e pequeno, é algo que, em vez de simplesmente reduzi-la a um pedaço de carne para o deleite masculino, adiciona uma outra camada à personagem, quando não ao filme. Lembramos de toda a sua trajetória, de como ela evoluiu e como acabou sendo a única sobrevivente, mesmo havendo na tripulação membros mais fortes e experientes que ela.

Para navegantes de primeira viagem - especialmente os acostumados com a discussão sobre a sexualização da mulher, o final de "Alien" pode parecer controverso no que concerne a aparência de sexploitation nesta cena. Mas é fácil perceber tal cena apenas tomou parte do engrandecimento da personagem de Sigourney Weaver, que se tornou algo muito maior do que o suposto sexploitation e ganhou relevância na ficção-científica do cinema, que se mantém até hoje.

"Aliens - O Resgate" está aí para não me deixar mentir.


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