domingo, 26 de abril de 2015

Sobre memórias: GP de San Marino de 2003.

Essa semana não foi fácil para mim, por um motivo bem complicado. Por esse motivo, vamos voltar um pouco no tempo e pensar um pouco sobre algumas coisas.

Era 2003. Aquele final de semana estava bem a cara daquilo que foi a temporada de Fórmula 1 de 2003. Um campeonato complicado, cheio de alternativas e recheado de emoções variadas, causado principalmente pela drástica mudança de regulamento da categoria, perpetrada para frear o domínio da Ferrari e de Michael Schumacher, que havia atingido seu quinto título mundial no ano anterior, de forma humilhante.

A quarta etapa daquele campeonato foi realizada no Autódromo Enzo e Dino Ferrari, San Marino, lugar tão regado a lágrimas. E com razão. 9 anos antes, lá morreram o austríaco Roland Ratzenberger e o brasileiro tricampeão Ayrton Senna. Imediatamente no ano seguinte, o circuito foi modificado.


Aquele campeonato vinha sendo dificílimo para a dupla campeã do ano anterior. Schumacher, àquela altura, era apenas o sexto colocado, com 8 pontos, 16 tentos distante dos 24 do líder, o finlandês Kimi Raikkonen. Não parecia ser um ano para a Ferrari, que sequer havia estreado seu carro de 2003 - só o faria na etapa seguinte, Barcelona.

A reação de Maranello veio a cavalo, figuradamente. Em Imola, o alemão tirou um coelho da cartola e cravou uma belíssima volta, 1nin22s327, apenas catorze milésimos abaixo do segundo colocado, o irmão Ralf Schumacher, da Williams. O brasileiro Rubens Barrichello ficou na terceira posição, a 0,230s, também um ótimo trabalho. Aquela classificação foi péssima para Raikkonen: Apenas a sexta colocação para o líder finlandês, a 8 décimos do tempo de Michael. Também candidato ao título, o colombiano Juan Pablo Montoya largou na quarta colocação.

Na corrida, Michael chegou a perder a ponta na largada para o irmão, Ralf, e Mark Webber, quinto no grid, largou no melhor estilo Webber e perdeu seis preciosas posições. Os dois irmãos alemães disputaram fortemente na primeira parte da prova, com Ralf em primeiro e Michael em segundo. Mas isso durou somente até a hora das paradas de boxes. Michael, mais pesado - àquela época, o reabastecimento era permitido na F1 - ficou apenas comboiando Ralf. Era uma tática velha conhecida daqueles que conhecem Michael Schumacher.

O trabalho mais eficiente da Ferrari nos boxes e o forte ritmo do alemão vermelho antes de cada parada deram à equipe italiana a primazia daquelas 62 voltas, com o pentacampeão a vencer pela primeira vez na temporada. A McLaren, que havia treinado com muito combustível, parou uma vez menos e ainda contou com a ineficácia de Ralf Schumacher em passar Raikkonen na pista, o que fez com que Barrichello pudesse ultrapassá-lo nas paradas de boxes. O alemão da Williams terminou em quarto. Montoya terminou apenas em sétimo, após uma corrida atribulada e um erro da equipe nos boxes.

O alemão comemorou vigorosamente a primeira vitória em 2003, saltou do carro e foi comemorar com a equipe e deu aquele pulo maravilhoso no pódio, certo?

Errado.

Na verdade, antes da corrida, pairou uma dúvida acachapante no ar: Michael e Ralf Schumacher estariam no grid àquela tarde?

Afinal, a mãe dos irmãos, Elisabeth, havia falecido horas antes, na manhã daquele domingo.

Os dois agiram com uma frieza de dar calafrios. Um venceu e o outro foi o quarto colocado.

Michael ainda juntou as últimas gotas de resiliência que lhe sobraram que naquele terrível fim de semana e completou o protocolo, comparecendo ao pódio para receber seu troféu. Mas não conseguiu ir à coletiva de imprensa. Assim que terminou o pódio, ele e Ralf deixaram Ímola e foram ao encontro da família para velar a mãe. Jean Todt, diretor-esportivo, foi em seu lugar.

Afinal, descobríamos que Michael Schumacher, considerado uma máquina, era um humano como qualquer um de nós.

Imagine se fosse, de fato, um ser humano como todos nós, e não um cerebral piloto de corridas.

Busquei no exemplo dos irmãos Schumacher a força necessária para passar por essa semana.

Meu ex-colega e amigo, André Dantas Verino, saiu desta vida para entrar na história na última quarta-feira (22). Estudei com ele por oito anos e estabeleci com ele uma relação de certa amizade e muito respeito.

Termino estas dolorosas linhas com a certeza de que Elisabeth e André estarão sempre a olhar por nós, onde quer que estejam.

Michael Schumacher e o troféu de vencedor: Amargo reencontro em Imola


Grande Prêmio de San Marino de 2003

1. M. Schumacher (ALE/Ferrari) 62 voltas em 1h28min12s058
2. Raikkonen (FIN/McLaren-Mercedes) + 1s882
3. Barrichello (BRA/Ferrari) + 2s291
4. R. Schumacher (ALE/Williams-BMW) + 8s803
5. Coulthard (ESC/McLaren-Mercedes) + 9s411
6. Alonso (ESP/Renault) + 43s689
7. Montoya (COL/Williams-BMW) + 45s271
8. Button (ING/BAR-Honda) + 1 volta
9. Panis (FRA/Toyota) + 1 volta
10. Heidfeld (ALE/Sauber-Petronas) + 1 volta
11. Frentzen (ALE/Sauber-Petronas) + 1 volta
12. da Matta (BRA/Toyota) + 1 volta
13. Trulli (ITA/Renault) + 1 volta
14. Pizzonia (BRA/Jaguar-Cosworth) + 2 voltas
15. Fisichella (ITA/Jordan-Ford) + 5 voltas (Motor)*

Abandonos
Webber (AUS/Jaguar-Cosworth) - eixo de transmissão
Firman (IRL/Jordan-Ford) - óleo
Verstappen (HOL/Minardi-Cosworth) - elétrico
Wilson (ING/Minard-Cosworth) - mangueira de combustível
Villeneuve (CAN/BAR-Honda) - motor

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Sobre o raro espécime "arara cegueta" e conjecturas sobre o poder

A arara cegueta, raro espécime no reino animal

Acho curioso o papel do poder nas relações humanas. Ao nosso lado, nos leva aos céus e nos provisiona momentos de prazeres quase luxuriosos. Em situação variante, porém, ele provisiona momentos em que exalamos o que há de mais nefasto em nossa psiquê. (Eu mesmo)

O Dr. Helmut Marko, consultor da Red Bull e conhecido como um caçador de talentos pouco ortodoxo para a categoria, tem sido mais falante do que nunca. Já vimos situações em que o grupo dos energéticos, sob a tutela de Marko, cometeu injustiças ímpares e díspares contra vários pilotos. 

Dos que eu vi correr pela Toro Rosso, no mínimo quatro sofreram com a falta de paciência do "Doutor" Helmut, desde o tetracampeão de Champ Car Sébastien Bourdais até Sébastien Buemi, Jaime Algersuari e, mais recentemente, Jean-Eric Vergne. 

No último caso, talvez o mais estarrecedor, Vergne era realmente um excelente piloto, e superou seus companheiros nos três anos em que disputou a F1 pela Toro Rosso, Daniel Ricciardo (hoje "líder" da Red Bull) e Daniil Kvyat, mas acabou alijado do projeto. Tremenda injustiça.

E, forçando um pouco mais a memória, também podemos lembrar o português Antonio Félix da Costa, que estava perto de assinar com a Toro Rosso, mas foi jogado fora em prol da contratação do pequeno Max Verstappen, o que deixou a quase todos de queixo caído. Max tinha apenas 16 anos na ocasião.

E não estou falando em termos exagerados, não. Marko quase que literalmente "jogava fora" mesmo todos os pilotos que não interessavam mais. E não é para menos: Marko se jacta até hoje da contratação de Sebastian Vettel, que se tornou tetracampeão com a marca Red Bull estampada no peito, e não admite pilotos de menor calibre. Nessa brincadeira, já vimos uma dupla de pilotos inteira sair da Toro Rosso em 2011 e 2014 - no último caso, Kvyat foi promovido, mas Vergne foi enxotado.

O fato de ter "descoberto" Vettel subiu à cabeça de Marko, a ponto de ele esquecer que o alemão é um piloto fora-de-série, um daqueles que se acham numa "safra" de 1000 pilotos, e em unidade. E Vettel é um exemplar raro, que encontrou as ótimas bases da Red Bull para trabalhar e também não era um piloto qualquer: Aprendeu na marra a corresponder à pressão que aquele meio lhe impunha e reagiu de forma fenomenal, atingindo uma precisão só antes vista em Schumacher e Fangio.

Não conseguir ser Vettel é a pedra no sapato dos pilotos que Marko demitiu. E não era culpa deles. O STR3-Ferrari era um bom chassi guiado por um piloto extraordinário. As únicas pole-position e vitória conseguidos pelo time de Faenza, outrora Minardi, vieram justamente naquele inesquecível GP da Itália de 2008. Depois disso, nem um pódio sequer. Até hoje.

"Mas tio, por que isso tudo? Você não ia falar da histeria do Marko?"

E irei. Mas era necessário elencar os motivos pelos quais os martírios públicos do consultor da Red Bull são fruto da mais pura hipocrisia, inveja e recalque e, naturalmente, pela perda do poder.

Marko começou sua série de verborragias nesse ano falando que seu domínio não se compara ao atual domínio da Mercedes. Nisso, vou ter que concordar com ele, que, apesar da hipocrisia pura, foi feliz nesta colocação. A Mercedes, além de ser mais veloz em relação aos outros, também conta com uma confiabilidade e consistência não vista nos carros dos touros de 2010 a 2013. Se os carros de Vettel e  Mark Webber não raro abandonavam por problemas estruturais dos chassis ou do motor, os de Lewis Hamilton e Rosberg primam por uma confiabilidade tremenda, além da velocidade, claro. 

A ameaça de sair da F1, também comentada por Marko, também fazia sentido. Do ponto de vista dos negócios, não é nada lucrativo para a Red Bull, outrora tetracampeã, continuar no circo sem vencer. Abandonar o esporte, ainda mais quando sabemos que os custos na categoria andam tão caros, não é tão drástico quanto parece, ao menos na minha opinião.

Duas conclusões óbvias: A perfeição dos Red Bull's dependia bastante da precisão de Vettel, que precisava largar da pole, sumir na ponta e ganhar, pois o carro precisava de pista livre para a melhor passagem de ar pelas linhas aerodinâmicas, sob pena de aquecimento de partes essenciais do carro, coisa que se agravava se o piloto não sabia lidar com muito tráfego à frente. Já Webber não era sequer vice-campeão por não conseguir ser tão preciso quanto o alemãozinho.

Até aí, tudo bem, Marko só havia falado a verdade. Mas a última do austríaco cegueta foi o estopim, era mais do que o que dava para tomar como lúcido.

Recentemente, o Dr. Helmut Marko acusou a Mercedes de ajudar a Ferrari. Não, vocês não leram errado. O consultor da Red Bull acusou, com todas as letras, a equipe alemã de beneficiar os italianos para reduzir o atraso da outra parte da F1 e favorecer uma briga inter-equipes. 

Eis aqui o que Marko disse. "Se você olhar para o quanto vencemos no ano passado, ficou claro que não seria sempre assim. É difícil provar, mas tenho certeza de que a Mercedes ajudou a Ferrari. E todos sabemos o motivo. Esperávamos melhorias, mas é difícil explicar tanto progresso em tão pouco tempo".

Então tá. A Mercedes ajudando a Ferrari? Mas pera aí, algo está errado. Tudo o que os alemães querem é tranquilidade para lidarem eles mesmos com sua própria equipe, principalmente com o ego cintilante de seus dois pilotos, não acham? Afinal, ninguém quer uma Ferrari com Vettel, Kimi Raikkonen e Maurizio Arrivabene fungando no cangote não é? Pois é. 

O que nos leva a uma conclusão óbvia: A histeria de Marko é sintoma de uma Red Bull desapoderada e irreconhecível, num beco sem saída. Ela não consegue nada em termos de competência dos motores da Renault, seu chassi não está uma beleza - para piorar, Adrian Newey está preparando sua aposentadoria do circo - e não há pra onde correr, pois a esta altura do campeonato, os motores Mercedes e Ferrari estão inalcançáveis. Afinal, ferraristas e mercêdicos seriam loucos de, a essa altura do campeonato, entregar motores aos austríacos, outrora seus algozes. Sabiam que seria como entregar o ouro ao bandido.

Há duas saídas para a Red Bull hoje. 

1. Tentar continuar com a Renault e ver no que dão as tentativas dos franceses em entregar equipamento de vergonha;

2. Apostar na Honda. Mas não sei se existe alguma cláusula contratual de exclusividade com a McLaren, e não sei se Dietrich Mateschitz estaria disposto a esperar pela evolução dos japas.

Já gostei mais da Red Bull. Já fui fã dos taurinos, eram uma equipe boa-praça durante os títulos de Vettel. Não gostaria de ver o fim da escuderia dos energéticos de forma tão deprimente. De qualquer forma, essas são duas saídas custosas ao time, se quiser permanecer na Fórmula 1 por muito mais tempo.

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Sobre Hamilton e o champagne na modelo chinesa

Hamilton e o clique da discórdia (Foto: AP)

A foto que mostra Lewis Hamilton espirrando champagne numa modelo chinesa durante a cerimônia de premiação do GP da China ganhou repercussão internacional depois que a líder de uma ONG de ativistas contra o sexismo, chamada de "Object", criticou a atitude do inglês. 

Segundo a diretora-executiva da ONG, Roz Hardie, a modelo chinesa não parecia confortável com aquela situação. "As fotos parecem mostrar não só que o champanhe está sendo muito especificamente direcionado para o rosto dela, como não parece que seja uma brincadeira voluntária por parte dela. Para a maioria das pessoas, é evidente que ela não está gostando. Se este for o caso, pensamos que Lewis Hamilton deveria pedir desculpas por suas ações e pensar cuidadosamente sobre como deve se comportar no futuro", disse Hardie.

E continuou: "O automobilismo parece retratar, desnecessariamente, as mulheres como objetos sexualizados. E isso provavelmente faz com que seja ainda mais difícil para as mulheres se defenderem. Esperamos que as pessoas desta indústria sejam mais respeitosas com elas".

"Certamente é uma posição muito difícil ser uma grid girl e ela não tinha muita opção a não ser permanecer ali e aguentar. É algo que ele deveria estar ciente. Mas em vez disso, ele parece ter abusado de sua posição. É lamentável que uma grande vitória tenha sido marcada por aquilo que parece ser um comportamento egoísta e arrogante", concluiu.

Mas vamos nos debruçar sobre o tema e analisar, na declaração, o que pode ser classificado como fato e o que é puramente "mimimi" da ativista, ou seja, onde ela pira na batatinha.

Vejo Fórmula 1 há muitos anos. Pelo que posso me lembrar, desde o final dos anos 90. Por aí já vão coisa de 15 anos assistindo corrida. 

O ambiente da Fórmula 1 já não me era muito diferente dos dias de hoje, salvo algumas coisas aqui e ali. As grid-girls sempre estiveram presentes, desde antes de eu começar a ver corridas e, se é verdade que hoje elas são objetificadas a ponto de chegar uma ativista de ONG para criticar, em épocas mais remotas do automobilismo, então, Hardie teria visto cenas verdadeiramente estuporantes. Avaliem se estivéssemos nos anos 70, com o hedonismo marcado pelas peripécias de pilotos como o playboy James Hunt, campeão de 1976. 

Mulheres eram, verdadeiramente, objetos de promoção de um ambiente completamente dominado pela libertinagem e sem o menor traço de policiamento de conduta. Isso podia até deixar a F1 mais autêntica, mas ao mesmo tempo a caracterizava como uma espécie de terra-sem-lei, uma Las Vegas do esporte a motor, onde tudo é permitido, doa a quem doer. 

Concordo que nessa fase do automobilismo ainda haja certa objetificação das mulheres, por parte de gente estúpida nesse meio, mas a Fórmula 1 mudou radicalmente - muito por causa de um sujeito chamado Bernie Ecclestone, vamos admitir. O baixinho modernizou a Fórmula 1 e um dos benefícios disso é que, se hoje ainda vemos grid girls, também vemos (muito) mais mulheres trabalhando naquele meio como engenheiras, repórteres, atendentes, profissionais de marketing, assessoras de imprensa etc. 

Na F1 pós-Ecclestone, isso mudou drasticamente. Não só o tratamento às mulheres, marca de um esporte que precisava se modernizar junto ao tempo e ao mercado, mas também o comportamento dos pilotos, que antes pareciam mais uns broncos que pouco se preocupavam com saúde ou longevidade, hoje são uns verdadeiros atletas. e os mecânicos, se antes vestiam-se como quem ia para uma colônia de férias, hoje são quase uns stormtroopers, trajados adequadamente em relação às medidas de segurança que este esporte exige. Obviamente há exceções aos estereótipos citados acima, mas certamente eram estes os mais comuns entre os profissionais que outrora faziam este esporte acontecer.

Senão. vejamos: A responsável pela assessoria de imprensa do melhor piloto de todos os tempos, Michael Schumacher, é, ora vejam, uma mulher: Sabine Kehm. Até chefe de equipe mulher a F1 tem atualmente: Monisha Kaltenborn, na Sauber. Fez suas besteiras no caso Giedo van der Garde, mas não é a pior chefe de equipe que eu já vi.

Gill Jones com Sebastian Vettel e Romain Grosjean no pódio do GP do Bahrein em 2013 (Foto: XPB Images)


Aliás, quem aqui se lembra da simpaticíssima Gill Jones? Eu lembro. Ela é - ou foi - a engenheira responsável por comandar o setor de eletrônica da Red Bull - uma equipe que viria a se tornar tetracampeã consecutiva - e, em 2013, por ocasião de uma vitória de Sebastian Vettel em 2013, no Bahrein, Jones foi a escolhida para representar a equipe no pódio, para receber o troféu da equipe vencedora entre os construtores. E o curioso é que foi numa cerimônia sem champagne - devido às rígidas leis sobre o consumo de álcool em solo barenita.

Percebemos, pois, um cenário que, se por um lado ainda promove certa objetificação das mulheres em relação ao corpo, também valoriza o suor feminino em diversos outros aspectos. 

Agora, com relação à polêmica em Shanghai: Eu vi a corrida. E vi o pódio. Além da modelo chinesa, Hamilton borrifou o champagne em Rosberg, no rival Vettel, no engenheiro da Mercedes e nos mecânicos e demais integrantes do time alemão. E não é uma particularidade do piloto inglês. É uma brincadeira recorrente entre os pilotos que compõem o pódio.

A "guerra da champagne" é uma tradição que existe desde tempos imemoriais - ou seja, quase desde a época em que o mundo do automobilismo se estabeleceu. Todos os pilotos que chegaram a compor o pódio da F1 fizeram e fazem isso. É o regozijo máximo do profissional que fez um árduo trabalho na pista e que tem ali um momento para dar lugar ao extravaso e à sensação de satisfação com a vitória. Um dos últimos resquícios de uma F1 não tão ortodoxa.

Não houve sexismo algum na procedência de Hamilton e tampouco no ato de jogar champagne na garota. Houve apenas o que todo piloto tem vontade de fazer quando chega ao pódio, ainda mais quando vence: Esborrifar a bebida alcoólica em quem ele puder. E não há nenhum desconforto comprovável que sustente a acusação, seja pela expressão facial que a modelo faz ao levar a borrifada de champagne, seja por qualquer coisa que tenha sido dita por ela ou suas companheiras de profissão. 

Sou a favor da luta contra todos os tipos de sexismo, mas é preciso direcionar melhor essa luta e não ficar dando "tiros ao vazio", como muito bem definiu o jornalista Fábio Seixas. É preciso lutar contra o sexismo de verdade e não criar uma situação absurda como esta, querendo atribuir a um profissional uma conduta que ele nunca chegou a praticar ou encorajar.


domingo, 12 de abril de 2015

Sobre Riccardo Rosberg (ou Nico Patrese?)

Nico Rosberg Mercedes AMG F1 in the FIA Press Conference
Nico está nocauteado


Pois é.

Se havia alguma esperança quanto a uma disputa interna na Mercedes neste ano, o que foi a única coisa que empolgou um pouco o campeonato de 2014, essa esperança parece não existir mais. E se ainda existe, não tem mais fundamento.

Lewis Hamilton é simplesmente inalcançável ante as mãos do alemão Nico Rosberg. São três poles consecutivas e duas vitórias do inglês, contra dois segundos lugares e um terceiro do alemão.

Nesse GP da China, Rosberg extravasou sua insatisfação. Mais de uma vez. 

Quando recebeu a notícia, pelo rádio, de que, mesmo dando mais do que pode de si, ficou a 42 milésimos do tempo da pole do companheiro, Rosberg soltou um sonoro e inconfundível "Ah, qualé?!". Na corrida, nunca foi uma ameaça ao inglês, que controlou todos os aspectos das 56 voltas chinesas como bem entendeu e não foi ameaçado por mais ninguém.

No pódio, cara de ânus. Era claro para qualquer um ali que o alemão não estava satisfeito. 

Como se não bastasse, Nico tentou lavar roupa suja com Hamilton justamente na coletiva de imprensa após o pódio. Disse que Lewis teria atrapalhando seu segundo stint e que por isso não fora rápido o suficiente. Na mesma hora, tomou um esporro do parceiro, que disse que não era responsável pela corrida dos outros e sim pela sua própria. Se eu fosse Rosberg depois de uma dessas, só daria as caras no Bahrein com um saco de pães na cabeça, porque olha...

Nico está destroçado. Derrotado. Limado. Podado. Acabado. Dominado. Seu psicológico está completamente abalado. Hamilton o destruiu. E o tedesco está transparecendo isso como nunca. Ele sabe que não está pilotando o suficiente para dar combate a Hamilton e já reconheceu isso uma vez. Mas agora, Rosberg viu que não adiantava nada reconhecer que estava mal. A solução que encontrou para mostrar que não estava satisfeito? Jogar para a galera. E se estava mal, ficou péssimo.

O caso de Nico Rosberg na Mercedes não é único. Lembra Nigel Mansell e Riccardo Patrese na Williams, em 1992. Enquanto Mansell voava com a Williams-Renault FW14B, considerada "de outro planeta", Patrese passava maus bocados e não raro era a "Williams-saco-de-pancadas". Patrese só venceu uma corrida naquele ano (GP do Japão de 1992). E, assim como Rosberg, o italiano era inofensivo a Mansell, que rumou para seu primeiro e único título na Fórmula 1.

O problema de Rosberg é que esse tipo de conduta irá, inexoravelmente, abalar sua imagem de piloto centrado e ponderado. Nessas condições, seu ambiente na Mercedes ficará insustentável. 

Se quiser dar combate a Hamilton, vai ter que pilotar muito mais do que isso. 

Outra opção - a melhor para o alemão, em vista do seu pífio desempenho até aqui - é sair da Mercedes e tentar a sorte em outra equipe, uma em que não tenha concorrência tão desleal. Porque sim, Hamilton tem um talento natural contra o qual Rosberg deu sinais de que não pode lutar.

Se não puder fazer a linha de piloto combativo e mesmo assim quiser continuar na Mercedes, vai ter que mudar essa postura de chorão, pois tudo o que uma equipe não quer nos dias de hoje - ainda mais uma equipe dominante, como a Mercedes - é um piloto trocando farpas com o outro em público.

Nas três hipóteses possíveis, ele vai ter que mudar essa conduta. 

Na boa, Nico, gosto de você e o acho um piloto fenomenal. Até torci por você em 2014. 

Mas ficar dando uma de chorãozinho só vai deixar claro que você não é tudo isso. Muito pelo contrário.

Sobre a questão Ricciardo

Daniel Ricciardo Daniel Ricciardo of Australia and Infiniti Red Bull Racing speaks with a member of his team in the garage before the Malaysia Formula One Grand Prix at Sepang Circuit on March 29, 2015 in Kuala Lumpur, Malaysia.
Não está fácil para o sorrisão em 2015

Uma das perguntas que não querem calar neste começo de ano é a seguinte: Que cargas d'água está acontecendo com Daniel Ricciardo?

Em tempo: Esse post vai sair depois do GP da China. Se pretendo fazer um post da corrida? Provavelmente, não. Achei a corrida divertida, mas não a ponto de me empolgar para escrever sobre ela na íntegra. Então, ficam minhas rápidas considerações aqui: Bela vitória de Hamilton, bom ver Vettel novamente no pódio e primeira corrida sem problemas de Raikkonen. Cabô.

Sem mais delongas, vamos nos debruçar sobre a questão Ricciardo.

O que está havendo com o pequeno canguru? Começou 2015 de uma forma muito apagada e fez mais uma corrida com requintes de crueldade em relação ao seu desempenho exemplar no ano passado. Para variar, fez mais uma corrida esquisita no GP da China.

Na largada, deu uma de Mark Webber em seus piores dias. Durante a corrida, perdi a conta de quantas vezes Ricardão errou pontos de frenagem e passou reto com pista sobrando. Para completar, levou constantes bailes de Marcus Ericsson (!), da Sauber nas disputas de posição, chegando a sofrer várias retomadas em X do sueco. Ainda conseguiu terminar à frente de Marcus, mas não conseguiu passar despercebido.

Estamos diante de um irreconhecível Daniel Ricciardo, essa que é a verdade.

O australiano fez uma belíssima temporada em 2014, mostrando a maturidade que normalmente um piloto muito experiente deveria mostrar e batendo sistematicamente então tetracampeão Sebastian Vettel. Teve um ano semelhante ao que Max Verstappen está tendo agora.

Ricciardo impressionou também pela latência. Não foi à toa. Daniel era, na verdade, um novato no clubinho da fantasia das equipes grandes na Fórmula 1. Os prognósticos eram os de que ele seria engolido por Vettel, que tinha acabado de conquistar seu quarto título com pomposas comemorações. Eu também apostava nisso. Mas o que se viu foi o completo oposto: Ricciardo não tomou conhecimento do companheiro tetracampeão.

Agora, vemos um Ricardão que, se estiver sorrindo, deve ter uma psiquê que atingiu proporções divinas.

Existem dois motivos possíveis para explicar essa queda de rendimento: 

O primeiro e mais óbvio, é que a Red Bull passa por uma crise sistêmica, sobretudo com sua fornecedora de motores, a Renault. Só hoje a fabricante francesa teve DUAS unidades de potência abrindo o bico - a de Daniil Kvyat - companheiro de Ricciardo - e a de Max Verstappen, da Toro Rosso. O clima entre o time de Dietrich Mateschitz está tão ruim que já chegaram ao nível de lavar roupa suja em público - já houve até nego chamando Adrian Newey de mentiroso. Obviamente, os dois pilotos viram vítimas no meio do tiroteio. Não há o que fazer diante disso. É um problema da equipe, não do piloto. Para piorar, Ricardão está tendo que lidar com os problemas do próprio chassi RB11, que não é essa coca-cola toda - o que até combina com o fato de ser um carro produzido por uma equipe de energéticos.

O segundo, mais complexo e que é fruto de uma reflexão sobre a carreira de Ricciardo, pode elucidar melhor essa situação: Daniel Ricciardo é experiente, mas ainda é seu segundo ano numa equipe grande e carrega consigo a responsabilidade de liderar a Red Bull na pista. 

E apesar da relativa experiência, Ricciardo é novo e não está 100% lapidado. Com Vettel na equipe, ele tinha um norte para guiar sua aprendizagem e ganho de experiência. Sem o alemão, Ricardão não apenas não tem essa referência - ao contrário, tem um companheiro inexperiente e combativo-, como também carrega as missões de 1. liderar o time e 2. regular o ímpeto do jovem Kvyat - os dois se bicaram na corrida de hoje, lembrem-se. E Kvyat passa pelo momento que ele mesmo passou em relação a Vettel no ano passado: Um piloto jovem e inexperiente em sua primeira temporada numa grande equipe.

Assim, minha conclusão é que Ricciardo está tendo que lidar não só com as mazelas da Red Bull, mas também está tendo que enfrentar seus próprios demônios.

O mais interessante é que esse fator de 2015 elucida uma coisa que eu disse aqui uma vez num texto meu: 2014 foi um campeonato completamente ATÍPICO e a temporada seguinte viria para regularizar essas coisas. Vettel está sendo melhor que Ricciardo, Massa está melhor que Bottas e Raikkonen está sendo o piloto rápido e combativo que sempre foi, devendo pouquíssimo ou nada para Alonso. - reparem que as comparações estão sendo com pilotos que foram companheiros de equipe uns dos outros em 2014.

As coisas estão normalizando na "hierarquia" de pilotos na Fórmula 1, neste ano.

O caso de Ricciardo parece estar nessas, também.

E, pelo visto, o sorrisão vai demorar um pouco para aparecer em sua plenitude na Fórmula 1 novamente.

sábado, 11 de abril de 2015

Sobre Lauda e aquilo que todo mundo queria dizer

*Deixando claro que o autor deste blog não tem obrigação alguma de ser imparcial porque não é jornalista noticiando alguma coisa (deixando claro aqui todo  o respeito que tenho para com os profissionais desta área), nem responde a superiores numa redação editorial ou o caralho à quatro que for. Então, quem for cantar a pedra do "autor parcial e corneta", já vou logo dando uma de nordestino arretado e mandando ir se lascar.


Niki Lauda, você é meu herói.

Saiu no Grande Prêmio e em diversos jornais espanhois, repercutido do jornal italiano "La Repubblica". Lauda criticou Fernando Alonso por ser "egocêntrico" e "mal-humorado", e ainda disse que o espanhol estaria "rasgando o cu"

Aqui, na íntegra, a declaração do austríaco.

"Alonso é egocêntrico, sombrio e mal-humorado. Tem um toque negativo. No ano passado, quando acabava uma corrida, não demorava para ele começar a criticar na imprensa: que isso ou aquilo não ia bem, que havia um problema, que não ganhamos. Como é possível levantar a moral de uma escuderia se seu piloto só fala mal dela sempre que pode?", começou o dirigente.

Lauda ainda falou da tolice de não se policiar nas críticas em relação à Ferrari. "Todo mundo sabe, que se você corre para a Itália (para a Ferrari), esta é uma atitude que não se pode permitir. Talvez em algum outro lugar do esporte as críticas sejam ignoradas, mas não em Maranello."

E ainda o comparou com seu arquirrival, Sebastian Vettel. "Vettel é o Sol, Alonso é a sombra".

A pérola maior da declaração foi esta: "Neste momento, o espanhol deve estar rasgando o cu. Tomou a decisão equivocada e, com isso, rumou sozinho em direção ao abismo."

Dessa eu vou rir até amanhã, pelo jeito.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Sobre EGOísmos


Bernie Ecclestone, Bernie Ecclestone...

O dirigente realmente está gagá, cambada. Fujam para as colinas.

Agora o baixinho apareceu para atacar a Mercedes, que domina a Fórmula 1 com mãos de ferro, e dizer em relação a Toto Wolff, chefe da escuderia alemã, que "não vai deixar o egoísmo de alguns matar a F1".

Como não sei quem defender nessa história toda, cagarei na cabeça de todos.

Se tem alguém que não goza de respaldo moral algum para criticar o egoísmo alheio, esse alguém é Bernie Ecclestone. 

Ao mesmo tempo que mantém a Fórmula 1 funcionando a duras penas, o dirigente inglês mantém um modelo que, definitivamente, deverá levar a categoria para um abismo nos próximos anos. Cobra taxas caríssimas de equipes para participarem do campeonato e outras taxas caríssimas para os países interessados em recebê-lo, põe o preço dos ingressos lá em cima para só receber os fãs ricos - o que deixou Hockenheim praticamente VAZIA no GP da Alemanha de 2014.

Como se não bastasse, além de agora não contar com as informações das parciais intermediárias dos pilotos nas voltas - S1, S2 e S3, o Live Timing da Fórmula 1 será integralmente PAGO. Ou seja, quem não quiser dar dinheiro neste troço, vai ter que se virar com as informações da TV. 

Isso sem falar no tratamento que o público de internet recebe da FOM fora do site oficial da categoria. Vídeos do youtube? Precisam passar por todo o tipo de malabarismos possíveis para não serem bloqueados por direitos autorais. Isso quando esses malabarismos surtem efeito. Ecclestone detesta a internet e já disse que, por ele, a Fórmula 1 seria um circo fechado para velhos ricos que podem comprar um Rolex.

E tudo isso para que ele, Ecclestone, seja o homem que mais capitaliza com a Fórmula 1. Eu mesmo não vou gastar 30 dólares nesta porcaria. Pra dar meu dinheiro a Bernie Ecclestone e assim compactuar com a fome de dinheiro dele? Não, obrigado.

Agora, se Bernie está CORRETO ao falar de Toto Wolff e da Mercedes? Sim, provavelmente está. E, neste momento desconsiderando sua hipocrisia, não poderia ter sido mais feliz em falar isso. Tanto Toto Wolff quanto a Mercedes estão capitalizando rios de dinheiro em propaganda com seu domínio na Fórmula 1 e a marca está se valorizando, mais do que em praticamente todos os momentos de sua história - exceto a primeira metade do século XX, claro. 

Obviamente, querem que as coisas continuem do jeito que está, pois para eles está ótimo, porque se mudar, a torneira pode fechar e abrir a cortina de um novo domínio na categoria, por uma outra equipe que não ela.

Está certa a equipe em defender seus louros? Do ponto de vista mercadológico, sim, está. Gastou dezenas de milhões de dinheiros para desenvolver essa engenhoca de tecnologia híbrida e, agora que está colhendo os frutos do seu trabalho, obviamente não quer que tudo isso vá por água abaixo tão cedo - o que é, praticamente, um eufemismo para "nunca".

Então a situação se resume a isso. Mudando, pode ficar ótimo para a Fórmula 1 e ruim para a Mercedes. Ficando na mesma, pode ficar péssimo para a categoria máxima e ótimo para o time alemão. 

Isso sem falar na divisão dos lucros da comercialização da F1, né? Na atual conjuntura, tem dinheiro sobrando nas mãos equipes que não precisam e dinheiro pingando nas mãos de equipes que lutam para se manter na ativa. Desse modo, como queremos uma competição sólida? Aliás, queremos uma competição sólida?

Nessa situação, ninguém sai do lugar, porque ninguém vai querer desistir do egoísmo sozinho.

A solução? Que todos desistam e trabalhem juntos por uma Fórmula 1 sustentável para todos.

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Sobre gurias no automobilismo - minhas conjecturas

Enquanto alguns (e algumas) já querem vê-las assim...

São fracas. 

Não conseguem competir no mesmo nível dos homens. 

O homem é mais forte que a mulher. 

A genética do corpo feminino é um calcanhar de Aquiles. 

Lugar de mulher é atrás de um fogão, não de um volante. 

Queremos vê-las como grid-girls, não competindo.

Esses são alguns dos exemplos de frases que já li. Frases obviamente proferidas com o intuito de justificar o parco quórum feminino no automobilismo.

Como se não bastasse, ainda apareceu algum zé-ninguém, que não conheço - ainda bem - para sugerir a ideia da criação de uma Fórmula 1 somente para mulheres.

Agora, o que eu acho disso tudo? Uma tremenda babaquice. E ainda machista, por sinal.

Mas primeiro vamos falar um pouco sobre essas ideias-clichê.

1. Mulheres não competem no mesmo nível dos homens? 

Pode até ser que isso seja verdade, mas é preciso esclarecer que isso não ocorre por alguma superioridade natural/genética masculina, mas sim por algum problema de desempenho das próprias mulheres, não inerente ao sexo.

2. O homem é mais forte que a mulher?

Existem pesquisas nesse sentido que tentam explicar as diferenças genéticas entre homem e mulher, mas não entrarei no âmbito de explorar essas pesquisas, pois o automobilismo, um esporte em que não há um contato físico direto e que se fundamenta na relação máquina-ser humano, poda qualquer chance de se recorrer ao determinismo biológico. 

Ou seja, isso não é inerente ao sexo de forma alguma. Mas para provar o que acabei de dizer, vamos recorrer a alguns exemplos práticos no próprio mundo do automobilismo. O mais recorrente de todos, obviamente, é o da estadunidense Danica Patrick. 

Danica tem carreira sólida no automobilismo, sendo a única mulher a vencer uma corrida no automobilismo internacional (2008, Twin Ring Motegi, no Japão, pela Fórmula Indy). Em seus anos de Indy, com exceção de 2005, Danica sempre terminou o campeonato entre os dez primeiros. Hoje, compete pela Sprint Cup Series, a divisão principal da Nascar. A Sprint Cup tem um dos campeonatos mais extensos de todas as categorias num ano só, com um calendário de quase 40 corridas. 

A se comprovar alguma inferioridade de Danica como mulher, seria necessário que ela não conseguisse sequer ser rápida ao volante de um Nascar, que dirá completar corridas de forma minimamente competitiva, disputando com seus colegas rapazes. Bom, uma breve olhada na "Vikipédia" pode comprovar que Danica não só chegava algumas vezes entre os dez primeiros nas corridas - a Sprint Cup frequentemente tem grids de mais de 40 carros por corrida - como também anotou uma pole-position, ora vejam, na classificação para as 500 milhas de Daytona.

Danica, porém, não é uma unanimidade como a melhor moça da atualidade na condução de carros de corrida. Ao contrário, ela é rechaçada. "Ain seu omi opressor deixa ela em paz". Não, não é porque ela é mulher. É porque é uma piloto rápida e agressiva, mas muito inconsistente. Não raro, ela se envolve em algum acidente ou rixa com algum outro piloto. Isso é o que a torna fraca e pouco atraente em termos de desempenho - sua inconsistência. 

Mas por que ela ainda compete, sendo fraca? Porque mantém ao seu redor uma forte campanha midiática. Ela pode ser uma piloto mediana na pista, mas é carismática e com isso ganha a complacência do público, principalmente entre mulheres que pouco ou nada entendem do assunto e acham que, independente do que a piloto fizer na pista, estará sempre em evidência por seu "caráter desafiador contra o ambiente opressor do automobilismo".

3. As mulheres são inferiores por causa de genética? 

Não, como eu já disse antes. O caso de Danica Patrick poderia até chegar a ser, em termos, uma constante entre as mulheres que correm, mas o potencial de mulheres competitivas não é impotente pelo determinismo genético, e sim pela pouca presença feminina nas corridas de carro. Porque é óbvio: Uma amostragem de 10 mulheres tem um potencial de aproveitamento virtualmente inexistente em vista da amostragem de 1000 homens no mesmo ambiente. Porque não parece absurdo colocar a proporção em 1 mulher para cada 100 homens, pelo que se vê no automobilismo atualmente.

Exemplo: quando estive presente ao 48º Campeonato Brasileiro de Kart, realizado aqui no Ceará, eram 117 os pilotos inscritos para a competição. Sabem quantas mulheres no meio? Uma, a paranaense Thaline Chicoski, a quem pude entrevistar após o campeonato.

E isso é quando tem mulheres presentes. Se não tem muitas meninas competindo nem mesmo no kart, alguma coisa está muito errada e a culpa disso não pode ser só das mulheres. Verdade seja dita, a construção cultural normativa da sociedade brasileira e a da maioria do planeta não associa mulheres a carros, mas a bonecas ou coisas do tipo. Alguns setores, até mesmo entre os homens, fazem até questão de dissociá-las da paixão por automóveis. Quebrar um paradigma cultural desse porte, para elas, não é uma tarefa das mais simples, mas, não raro, acontece.

Quando você tem o interesse de ingressar num esporte como o automobilismo, o interesse na sua presença por parte de quem está ali pode contar muito a favor ou contra. E é aqui que grande parte das mulheres que tentam, acabam meio que perdendo a vontade de competir. Então, para colocar em pratos limpos, o que conta para o desinteresse feminino não é outra coisa senão a falta de incentivo por parte de quem rege o automobilismo (como eu disse antes em outro texto) e também a receptividade quase nula dos pilotos que ali estão. 

Algo que poderia muito bem ser resolvido num punhado de anos com uma democratização do acesso ao automobilismo. O coeficiente feminino certamente aumentaria, em detrimento do sexismo presente entre os homens.

4. Lugar de mulher é atrás de um fogão, não de um volante. Essa afirmação procede?

Não há nem a necessidade de comentar essa, senão pela iniciativa de explicar que é esse tipo de frases que desanima algumas mulheres em relação à competição. Mas elas não desistem só pela mera provocação machista vinda de alguns colegas de profissão, e sim por esse tipo de pensamento estar também na linha de raciocínio de alguns "cartolas" que regem o automobilismo e que por isso acabam tendo não apenas poder, mas também influência suficiente para desincentivar o acolhimento às moças no mundo do esporte a motor.

Esses são os problemas que surgem quando pensamos e problematizamos a conjuntura do automobilismo para elas. São problemas complexos e que não vão se resolver da noite para o dia, e que precisa não só do engajamento dos setores ligados ao esporte a motor, mas de uma mudança conjuntural da sociedade como um todo.

Outros - e até outras (!) - teimam em querer vê-las apenas assim - lastimavelmente

sábado, 4 de abril de 2015

Sobre WEC e sexismo (?)

Grid-girls fora do WEC; Medida vai minar o sexismo? Creio que não
Tá lá no Grande Prêmio. Matéria aqui pra quem quiser ler.

Gérard Neveu, diretor-executivo do Mundial de Endurance (WEC), vai terminar com a famosa tradição de colocar garotas no grid antes da largada durante as corridas. 

As famosas "grid-girls", responsáveis por carregar plaquinhas com nomes dos pilotos no grid e ajudar a promover as provas, não estarão mais na pista durante os eventos das corridas de Endurance do WEC. A decisão foi apoiada por várias figuras da categoria, incluindo Anthony Davidson, campeão pela Toyota em 2014 (e ex-F1), que ainda disse ser um pouco sexista a presença das modelos no grid.

O que eu acho? Que foi uma decisão errada. 

Mas vamos lá, explicar isso direitinho pra não passar de "machista" depois. 

Qual é a intenção? Minar os comentários sexistas de homens - e até de algumas mulheres? Nisso, Neveu pode ter sido assertivo. O problema é que ali as grid-girls exerciam um papel de promoção não só do evento WEC, mas também estavam promovendo um mercado que atrai muita gente ademais os machinhos - chatinhos - de sempre. Atraem estilistas de moda e até outras mulheres, interessadas em tomar - ou não - o padrão de moda ali exibido como referência para elas mesmas.

Eventos de automobilismo, como os de todo esporte, afinal, servem como ambientes muitos lucrativos para patrocinadores e praticamente todo o tipo de produto ali é exibido. E nem precisamos ir muito longe. Na Fórmula 1 mesmo, a mais prestigiada equipe do circo exibe em seus carros as marcas de um banco espanhol, de um energético brasileiro, de um antivírus, de uma montadora italiana etc. Colocar uma garota bonita pra exibir sua marca, então, é ainda mais chamativo. Além disso, sou da ideia de que poderiam colocar homens nessa jogada também. Grid-boys. Por que não? Poderia atrair o público feminino com a mesma finalidade.

E outra coisa, mais importante ainda: Tirar as grid-girls não vai cessar o machismo presente no automobilismo. Nem diminuí-lo. Os homens que achavam mulheres incapazes de competir este esporte (percebam a restrição, não são todos) continuarão a ter essa opinião. Se outras categorias não seguirem o exemplo do WEC, os comentários sexistas continuarão, e isso será uma constante onde quer que resista essa tradição.

E é por isso que eu acho que Neveu fez, na verdade, uma espécie de fan-service.

Afinal, se isso não reduz o sexismo, o que poderia fazê-lo?

Fácil. A própria FIA, enquanto entidade que rege as leis das corridas de carro, poderia começar a criar incentivos sólidos para a participação das garotas no automobilismo, desde o kart até a Fórmula 1 ou qualquer outro destino que elas queiram seguir. 

E além do automobilismo, a FIA também rege os trâmites da transitividade de automóveis no mundo. Iniciar uma campanha para minar os paradigmas presentes no trânsito, de que mulheres são menos capazes que homens ao volante, poderia fazer ainda mais com que as meninas se interessassem não só por dirigir, mas quisessem também, em alguns casos, ares mais altos.

Esse conjunto de iniciativas sim poderia minar, de fato, o sexismo presente não só nas corridas, mas também no trânsito.

Mas a FIA não é conhecida por ir direto ao ponto para resolver os problemas. Ao contrário, a entidade escolhe as atitudes que toma de acordo o que menos poderá lhe afetar.

E o sexismo vai continuar. No WEC e no mundo das corridas de carro do mundo inteiro.

Tanto pela teimosia de setores do automobilismo em investir nas atitudes erradas quanto na inapetência e desinteresse da FIA em resolver os verdadeiros problemas que assolam este esporte.