Existem filmes que te pegam de surpresa com o quão bons eles são, e que genuinamente surpreendem através de um roteiro ou ideia inusitada/inusual para o gênero em que eles estão inseridos. E filmes que fazem o mesmo feijão com arroz de sempre, se agarrando às convenções do seu gênero e que nunca fogem do óbvio.
Halloween Kills (2021) parece ser um misto desses dois aspectos, mas não em seu todo. O novo capítulo da franquia de Michael Myers consegue ser, por vezes, um tipo de história não contada antes na franquia.
É interessante a proposta de transformar a população de uma cidade em uma massa ensandecida e revoltada em busca de vingança contra Michael Myers, e dou créditos aos roteiristas, porque isso é crível e verossímil, ainda mais por encontrar ecos no cenário atual que vivemos. Do ponto de vista da crítica social, esse é um filme que, embora não seja completamente original, não faz feio. Ora, é nos Estados Unidos que pessoas completamente despreparadas e desestruturadas conseguem armas no mercadinho da esquina e saem por aí tentando fazer justiça com as próprias mãos, não é? É frequente.
Ele flerta com uma crítica social que, embora não seja a mais original do mundo, a forma como foi utilizada neste projeto me parece ser inédita em “Halloween”, de uma forma que o pretensioso remake sanguinolento de Rob Zombie (2007) nem chegou perto.
David Gordon Green, por sua vez, me parece um pouco mais esperto e foge da psicologia barata adotado outrora pelo cineasta roqueiro. O respeito pela iconografia da franquia do Assassino de Babás é nítido em cada aspecto estético visual e sonoro deste filme (algo que, aliás, destaca essa nova trilogia das inúmeras continuações anteriores). O respeito dele pelo estilo de John Carpenter perpassa cada cena, seja com o esperto uso das clássicas trilhas sonoras, os longos takes de câmera acompanhando o assassino e a eficiente construção de tensão em algumas cenas.
Mas respeitar o estilo de um diretor não te torna talentoso o suficiente para emulá-lo perfeitamente. Aqui temos as limitações de Green. O filme até sabe fazer cenas esteticamente tensas, mas na maioria das vezes ele simplesmente não consegue fazer os personagens serem identificáveis. E quando você não se identifica com os personagens, você não se importa com eles e só quer que eles morram logo. Pois é exatamente isso que acontece aqui: um monte de personagens completamente estúpidos, que tomam decisões estúpidas por motivos estúpidos, o típico clichê do terror slasher. Como gerar tensão em cenas que você sabe que vai todo mundo morrer e, portanto, só espera o jumpscare? Ademais, há muita tentativa de apelar à nostalgia dos fãs, e algumas coisas até funcionam, mas outras não passam de peso morto e tempo de tela inútil com situações completamente previsíveis, como o retorno de alguns personagens do clássico setentista. Potencial desperdiçado é a expressão-chave aqui.
Senti falta de Jamie Lee Curtis nos momentos mais cruciais. Apesar disso, é bom ver que pelo menos nisso, o filme é bem coerente: Laurie Strode sente os efeitos do combate anterior com Michael e este filme não os despreza, no que faz bem. Mas é nítido que o arco de Laurie é o gancho para a sequência.
Mas o que este filme de fato entrega de melhor é aquilo que seu título promete: muita sanguinolência e morte. Este é, sem dúvida, o longa mais sangrento da franquia. Supera até mesmo o remake de Rob Zombie neste aspecto. Para os espectadores que estiverem querendo um filme violento, este projeto entrega tudo e mais um pouco: muitas mortes, a maioria extremamente violentas, com muito sangue e vísceras escorrendo com gosto. Michael Myers, aqui, está em seu melhor: poderoso, brutal e virtualmente invencível. Pegou, matou.
No fim, Halloween Kills é muito nostálgico, violento e traz um protótipo de crítica social foda, mas não vai muito além de um slasher genérico. Apesar disso, traz relativa coerência no arco da protagonista e consegue ser um entretenimento passável.
Nota: 6,5